Artigo: O que temos a aprender com os slams sobre escuta radical das juventudes?

O que temos a aprender com os slams sobre escuta radical das juventudes?

Neste mês de outubro, aconteceu, em São Paulo, o Slam SP – Campeonato Paulista de Poesia Falada, que reúne poetas de todo o estado para trocar poesia e vida. Sou membra ativa dos movimentos de literatura marginal-periférica desde a adolescência, participando de saraus, depois de slams e esses espaços me constroem de modo imenso. Participar novamente de um campeonato desse porte, depois de dois anos de distanciamento físico por conta da pandemia me fez refletir sobre algumas questões que compartilho nessa coluna do mês por aqui.

Slams, para quem não conhece, são competições de poesia falada nascidas na década de 80 em Chicago e que chegam ao Brasil em 2008. Para participar basta ter três poesias autorais de até três minutos e ao recitá-las não fazer uso de nenhum objeto cênico, instrumento musical ou figurino. É só você, seu texto, seu corpo e a performance que você consegue criar na junção de todos esses elementos. Dentre as pessoas que assistem, cinco são escolhidas para serem juradas e darem notas de 0 a 10 para cada poeta que recite. A maior a menor nota caem e na soma das três do meio chega-se a uma média. Na primeira rodada todas as pessoas inscritas recitam, na segunda as cinco pessoas com as maiores médias e na terceira e última as três pessoas com as maiores médias. Dentre as três, uma se torna campeã.

 

Se há algo que aprendi com a literatura que pulsa das quebradas Brasil afora, esse algo é que toda pessoa pode ter algo a dizer. Aquela frase clichê e batida de “dar voz” não nos cabe e nunca nos coube. Toda pessoa tem voz, inclusive pessoas surdas que em coletivos como o Slam do Corpo sinalizam em Libras um universo de visões sobre o mundo ao seu redor. O que sempre nos faltou foram espaços de escuta. Eu iria até mais além e diria que falta a escuta verdadeira, ativa ou como prefiro chamar aqui, radical.

As falas que trazemos em nossos textos como poetas, especialmente nas competições de poesia falada como o slam abordam temáticas urgentes da sociedade. De questões raciais, de gênero, classe, direito à cidade, xenofobia, intolerância religiosa a LGBTQIAP+fobia. As poesias por si mesmas podem ter um tom que soe de algum modo radical, colocando o dedo na ferida de problemas sociais estruturais e estruturantes de desigualdades históricas.

Participando de slams eu me vi em diferentes momentos da vida escrevendo de maneira propositiva sobre dores profundas, questões que não diziam respeito apenas à minha vivência, como também de tantas outras jovens mulheres negras periféricas. Escrever e declamar por si só são atos curativos, que me auxiliam na continuidade da vida a despeito dos caminhos tortuosos que ela tome. Mas ainda mais, saber que há uma escuta radical daquilo que digo me faz sentir pertencente.

Qual foi a minha alegria ao ver na competição estadual desse ano em São Paulo dues estudantes da rede pública de ensino, participantes da iniciativa Slam Interescolar sendo poetas participantes do Slam SP? Nuel (17) e Vickvi (18) são filhes poétiques do Slam do Prego, de Guarulhos (cidade da região metropolitana de São Paulo) e observar es dues se apresentando me preenche de uma memória boa de quando era eu, a – ainda mais – jovem encontrando nos slams um espaço de acolhida e força.

No slam corpos dançam, vozes ecoam, ouvidos destravam e como em poucos espaços da sociedade contemporânea, a coletividade reflete de modo intencional sobre o futuro que queremos construir e o passado que queremos deixar para trás. Somos majoritariamente jovens poetas negres, desenhando projetos de mundo em nossos versos. O quão incrível seria termos espaços como slams disponíveis para todes jovens em qualquer parte do Brasil? E mais ainda, considerar esses gritos que dimensionam o que precisa ser transformado no mundo de maneira radical, lembrando que é na escuta que nos fazemos e refazemos.

Te convido à escuta radical do slam a todos os espaços da sociedade, especialmente das juventudes. Você sente que tem praticado?

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