PISA 2022: Por que o Brasil está nas últimas posições em matemática, ciências e leitura?
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Médias brasileiras permanecem estáveis em relação a 2018, mas estamos muito abaixo dos demais países da OCDE
Os resultados do PISA 2022, principal avaliação internacional de ensino básico, revelam panorama desafiador para o Brasil.
Apesar de termos mantido um desempenho estável entre 2018 e 2022, continuamos na parte inferior do ranking, com notas muito abaixo das médias registradas pelos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
A Fundação Roberto Marinho conversou com Ernesto Martins Faria, Diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) para avaliar os resultados e refletir sobre os caminhos para superar os desafios do ensino básico brasileiro.
Confira os principais resultados do PISA aqui
O PISA
O PISA, sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, é uma prova aplicada em 81 países para avaliar o desempenho de alunos de 15 anos em matemática, leitura e ciências.
A avaliação é realizada a cada 3 anos, mas a edição de 2021 foi adiada para 2022 por causa das restrições impostas pela pandemia. A última avaliação havia sido feita em 2018. O Brasil participa do PISA desde 2000.
Ranking do Brasil
Apesar dos impactos causados pela pandemia de Covid-19 (como fechamento das escolas e desigualdade no ensino remoto), nosso país subiu algumas posições no ranking, se comparado à última edição do PISA.
Dentre os 81 países participantes, nossa classificação foi:
Matemática - 65º lugar
Em relação a 2018, subimos 6 posições (de 71º para 65º). Estamos atrás da Colômbia, Costa Rica e Peru.
Leitura - 52º lugar
Em relação a 2018, subimos 5 posições (de 57º para 52ª). Nossa nota foi inferior à da Costa Rica, México e Uruguai.
Ciências - 62º lugar
Em relação a 2018, subimos 2 posições (de 64º para 62º), ficando atrás do México, Peru e Argentina.
Brasil x OCDE
A média da OCDE caiu significativamente em todas as áreas avaliadas. O impacto da pandemia foi maior entre países que registravam índices mais altos de desempenho e habilidades em matemática, leitura e ciências.
O gráfico abaixo traz um comparativo entre a média dos países da OCDE e a média brasileira:
Matemática
73% dos estudantes brasileiros não alcançaram o nível básico (nível 2) em Matemática, considerado pela OCDE o mínimo necessário para que os jovens possam exercer plenamente sua cidadania.
Isso significa que 7 em cada 10 alunos brasileiros de 15 anos não sabem resolver problemas matemáticos simples, como:
- converter moedas: dizer, por exemplo, quantos reais equivalem a 2 dólares, sabendo que 1 dólar = R$ 4,93;
- comparar as distâncias percorridas por um carro em dois caminhos diferentes.
Para Ernesto Martins Faria a situação é muito alarmante:
Alunos de 15, 16 anos estão tendo o aprendizado esperado para alunos de 11, 12 anos. O Brasil vai pior em matemática e tem muita desigualdade, há uma diferença muito grande entre escolas privadas e escolas públicas.
Ernesto Martins Faria
Entre os países membros da OCDE, esse valor (Nível 1 ou abaixo) foi de 31%.
Leitura
Metade dos estudantes brasileiros não têm o nível básico em leitura, considerado pela OCDE como o mínimo para exercer sua plena cidadania.
Entre os países membros da OCDE, esse valor foi de 26%. Esses jovens encontram-se no nível mais baixo da avaliação.
Ciências
Em 2022, mais da metade (55%) dos estudantes brasileiros não atingiram o nível básico em Ciências. 1% dos estudantes atingiu o nível 5 de proficiência em Ciências. Não temos estudantes no nível máximo de proficiência.
Entre os países membros da OCDE, 24% dos estão com desempenho abaixo do nível 2.
Pós pandemia e cenário global
Em comparação a 2018, o desempenho médio dos países da OCDE caiu 10 pontos em leitura e quase 15 pontos em matemática. Em ciências, a média ficou estável.
Cerca de 25% dos jovens dos países da OCDE não atingiram o nível 2 em matemática e leitura. Ou seja, aproximadamente, 16 milhões de estudantes de 15 anos têm dificuldade em fazer cálculos com algoritmos básicos ou interpretar textos simples.
Na Alemanha, Islândia, Noruega e Polônia, as notas em matemática caíram 25 pontos ou mais entre 2018 e 2022.
Para analisar os resultados da principal avaliação internacional de ensino básico, a Fundação Roberto Marinho ouviu o especialista Ernesto Martins Faria, Diretor-fundador do Iede.
Fundação Roberto Marinho: Qual a sua avaliação sobre os resultados do PISA 2022?
Ernesto: A princípio, eu acho o resultado relativamente positivo. Havia muita preocupação de que, com a pandemia, houvesse uma grande queda do Brasil nos resultados e uma significativa redução na aprendizagem. O que não ocorreu. Isso pode indicar que tivemos um trabalho para garantir que defasagens extremas de aprendizagem não acontecessem. Há países, como o Paraguai, por exemplo, que estão em patamares mais baixos que o Brasil.
No entanto, ficar estável no PISA frente à situação de aprendizagem no Brasil não dá para comemorar. Poucos jovens entre 15 e 16 anos têm o aprendizado adequado para a sua idade.
Fundação Roberto Marinho: Em entrevista ao CNN, Claudia Costin ressaltou que o Brasil foi um dos países menos impactados no ranking após a pandemia e que as escolas de tempo integral tiveram uma participação bem positiva nos resultados. Qual a sua visão em relação a esses aspectos?
Ernesto: Não temos uma grande amostra de escolas integrais que tenham participado do PISA, então não podemos ter 100% de certeza. Acredito que seja uma hipótese, uma vez que as escolas integrais desempenham um papel crucial, especialmente para alunos com defasagem de aprendizado significativa.
Um aluno do 8º ano não deve apenas aprender o esperado para aquele ano, mas também o conteúdo dos anos anteriores (5º, 6º e 7º ano). Uma solução importante para assegurar esse aprendizado é proporcionar mais tempo pedagógico. Para esse aluno, 4 horas de ensino podem não ser suficientes. Ter mais tempo pedagógico e estratégias para personalizar o ensino, atendendo tanto alunos com baixo desempenho quanto os de desempenho mais alto, é fundamental.
Um aluno do 8º ano não tem que aprender só o esperado para aquele ano, mas também o esperado para 5º, 6º ,7º e 8º ano.
Ernesto Martins Faria
Fundação Roberto Marinho: Qual a importância de uma avaliação internacional como o PISA?
Ernesto: O PISA é muito importante para termos um diagnóstico internacional, não para competir com outros países, mas porque queremos que um aluno brasileiro possa ter oportunidades em qualquer carreira. Pensando no mercado de trabalho, ele precisa ser um aluno competitivo em relação a estudantes de qualquer outro país. Isso é relevante, inclusive, sob a perspectiva da educação como mecanismo de ascensão social. Espero que um jovem de baixa renda possa ter uma educação de qualidade para poder concluir seus projetos de vida.
Não podemos deixar de comparar a educação brasileira com o restante do mundo. Isso traz benefícios para a própria educação brasileira. Podemos refletir sobre nossas avaliações nacionais, verificar se estão adequadas e aprender com parâmetros internacionais. Poder analisar, por meio de uma avaliação robusta como o PISA, como o sistema educacional tem evoluído, é importante para começar a ter hipóteses de políticas públicas mais efetivas. O PISA fornece um parâmetro importante para o Brasil e ajuda no entendimento do progresso do país na área educacional.
Fundação Roberto Marinho: Quais seriam as três ações prioritárias para melhorarmos nossa posição no ranking?
Ernesto: Mais tempo pedagógico e a educação integral desempenham um papel crucial nesse sentido. Investir na formação de professores e garantir os processos necessários para termos profissionais de alta qualidade também. Isso envolve tornar a carreira do professor mais atrativa e valorizada, atraindo alunos talentosos do ensino médio para a docência.
Enfrentamos um desafio significativo, já que muitos alunos saem do sistema educacional com um baixo nível de aprendizagem na educação básica. Reverter esse cenário será difícil se os futuros professores foram alunos com baixo desempenho na educação básica. Portanto, é essencial aprimorar a formação inicial, fornecendo amplo suporte e estrutura na sala de aula.
Além disso, precisamos elevar o padrão da nossa educação. Apesar da implementação do ensino fundamental de 9 anos, não elevamos substancialmente o nível do que é ensinado no início desse ciclo. Devemos apresentar textos mais longos e complexos aos alunos, demandar mais deles em relação à matemática e conectar o ensino de maneira mais significativa com a vida do estudante.
Nossas avaliações devem alinhar-se com os padrões internacionais, buscando inspiração em países que possuem sistemas educacionais de alta qualidade. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) já tenta desempenhar esse papel de elevar o padrão, e precisamos continuar nesse caminho.