Artigo: Não somos todos iguais

Não somos todos iguais: educação antirracista contra o racismo histórico do país

Quem nunca ouviu a frase: "Não enxergo cor e sim seres humanos" para justificar que determinada pessoa não tinha preconceito? Pois, é essa fala muito comum segue a linha de "somos todos iguais, não tem por que fazer diferença, isso sim é segregar". Eu vou dizer para vocês que sim, é preciso ver as diferenças sempre. Não somos todos iguais. E isso não é segregar, isso é pensar em como incluir.

A história da educação e da escolarização dos negros em nosso país foi marcada por desigualdades. E isso tem reflexo até os dias de hoje.

Basta ver que no Brasil tínhamos leis que impediam pessoas negras de se alfabetizarem. A primeira lei de educação, de 1837: impedia os negros de irem para a escola.

Lei nº 1, de 14 de janeiro de 1837: “São proibidos de frequentar as escolas públicas: Primeiro: pessoas que padecem de moléstias contagiosas. Segundo: os escravos e os pretos africanos, ainda que sejam livres ou libertos”. Essa lei já deixava bem claro, com trocadilhos, para quem era a Educação no Brasil.

Para os que hoje criticam a Lei de Cotas, vale lembrar que foi criada a Lei nº 5.465, de 3 de Julho de 1968, conhecida como Lei do Boi. Essa foi a primeira Lei de Cotas, mas ela não era para pessoas negras e sim para brancos, filhos de donos de terras, que conseguiram vaga nas escolas técnicas e nas universidades

Art. 1º. Os estabelecimentos de ensino médio agrícola e as escolas superiores de Agricultura e Veterinária, mantidos pela União, reservarão, anualmente, de preferência, de 50% (cinqüenta por cento) de suas vagas a candidatos agricultores ou filhos dêstes, proprietários ou não de terras, que residam com suas famílias na zona rural e 30% (trinta por cento) a agricultores ou filhos dêstes, proprietários ou não de terras, que residam em cidades ou vilas que não possuam estabelecimentos de ensino médio.

Aí você pode dizer: "Mas isso foi antes da Constituição criada em 1988". Sim, mas foram necessários 488 anos para ter uma constituição que dissesse que racismo é crime. E mesmo assim, sentimos até hoje o reflexo desta falta de acesso da população negra às escolas no Brasil.

Então, vamos falar sobre as políticas públicas? Vamos!

Para que políticas públicas sejam criadas atendendo a todos "sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas", conforme está no artigo 153 da Constituição, é preciso que saibamos quem são as pessoas. Para saber quem são as pessoas e do que elas necessitam, e nem todos têm as mesmas necessidades, é preciso que façamos pesquisas. Dados são importantes fontes de informação que possibilitam análises, estudos e o desenvolvimento de políticas públicas baseadas em evidências que podem garantir um melhor acesso da população aos seus direitos.

Como vamos saber onde e quem carece de mais investimento em Educação se não fizermos uma pesquisa?

Os dados são fundamentais para dar um rumo aos debates e sairmos do achismo. É preciso ter os números e irmos além deles, além dos dados quantitativos, e compreender os processos e contextos históricos em que estão inseridas as informações.

Só para não esquecermos: veja cor em tudo. Pois tudo tem cor, até mesmo o acesso à Educação de qualidade.

Dados do IBGE, revelam que a Região Nordeste é onde o acesso à educação é o mais restrito, com 34,7% da população excluídos deste direito, seguida das regiões Sul, Norte, Centro-Oeste e Sudeste (24,1%). Ou seja, sabemos qual região do Brasil precisa ampliar o acesso das crianças e jovens à escola. E, coincidentemente, ou não, o Nordeste é a região com mais negros no Brasil.

Outro dado que mostra que Educação tem cor: Estudantes negros foram mais impactados na pandemia, segundo uma pesquisa realizada pelo Itaú Social, Fundação Lemann e BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).

Quando falamos em escolas privadas, outro dado importante e com recorte racializado é o que revela que menos de 10% dos alunos de escolas privadas de alto desempenho são negros. Essa pesquisa do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA) realizada com base no Censo de 2020 mostra ainda que o percentual de alunos negros e pardos nessas instituições tende a ser ainda menor quanto mais cara e mais bem posicionada no Exame Nacional do Ensino Médio forem.

E para finalizar, um dado não menos importante e que fecha esse ciclo de análise de dados e cor: em 2022, o Brasil tem o menor investimento na educação dos últimos 10 anos, segundo dados do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), uma organização não governamental. Para você ter uma noção, Somente em 2021, a Educação teve despesas autorizadas avaliadas em R$ 129,8 bilhões. Isso representa, aproximadamente, apenas R$ 3 bilhões a mais do que os gastos em 2020 que chegaram a R$126,9 bilhões. Contudo, o relatório apresenta uma realidade diferente, na qual a execução financeira da verba total do investimento na educação foi inferior a R$118,4 bilhões.

Contra fatos não há argumentos. Entende por que precisamos ver cor em tudo? Os dados que eu trouce aqui revelam um país onde os negros são os que mais sofrem quando não há investimento em educação no país. Sim, Educação é historicamente uma questão de cor.