Notícia: Intelectuais negros propõem novo acordo para equidade racial no Brasil

Intelectuais negros propõem novo acordo para equidade racial no Brasil

“A Resistência Negra ao Projeto de Exclusão Racial – Brasil 200 anos (1822-2022)”

As desigualdades raciais insistem em moldar o cotidiano brasileiro e estudos mostram que os fatores de classe, raça e gênero podem ser determinantes na vida da população. Os desafios enfrentados hoje se devem a processos históricos inconclusos: “A independência brasileira foi um fracasso se considerarmos a máquina de produção contínua de desigualdades”, pontuou o professor Hélio Santos, no lançamento do livro “A Resistência Negra ao Projeto de Exclusão Racial – Brasil 200 anos (1822-2022)”, publicado pela editora Jandaíra, dia 13 de outubro, no auditório do Museu do Manhã, no Centro do Rio de Janeiro, com apoio da Fundação Roberto Marinho e outras instituições.

Doutor em administração e ativista pioneiro no pensamento de políticas para a redução de desigualdades raciais, Hélio organizou a coletânea que traz a visão de 34 acadêmicos, escritores, poetas e ativistas sobre os 200 anos de independência do nosso país. O time de autores conta com nomes como a escritora Conceição Evaristo, a filósofa Sueli Carneiro, a poeta e atriz Elisa Lucinda, a psicóloga Cida Bento, a escritora Djamila Ribeiro e o antropólogo congolês Kabengele Munanga.

O livro apresenta 33 textos que trazem visões críticas sobre a questão racial e abordam diferentes temas: meio ambiente, reforma tributária, ações afirmativas e de reparação, segurança pública, política e economia. A publicação coloca o dedo nas feridas abertas da nossa sociedade e marca o posicionamento da intelectualidade negra brasileira diante do cenário atual. Na fala de abertura, o professor Hélio reforçou a importância política do livro:   

“Essa coletânea não é neutra, temos lado e buscamos aliados que sonhem por um país mais justo. A inteligência negra brasileira não poderia se calar diante do silêncio em que não se faz uma justa referência a nossa história. A cada 10 anos de Brasil, em 7 ocorrem escravidão", declarou o organizador da coletânea.   

Ao mesmo tempo em que o Brasil figura entre as 10 maiores economias do mundo, pelo critério do Produto Interno Bruto (PIB), se destaca entre os 10 mais desiguais do planeta. A questão racial surge como parte das desigualdades e tem caráter fundador de uma nação que conta com mais de 350 anos de escravidão. É importante lembrar que metade da população brasileira é formada por negros, ou seja, mais de 116 milhões de pessoas, e que desde o séc. XVI o movimento negro trava inúmeras batalhas para o avanço das pautas raciais. A escritora Conceição Evaristo foi aplaudida de pé e ovacionada quando subiu ao palco e foi recebida com muito carinho pelo ator Hilton Cobra, mestre de cerimônia do evento.

A escritora Conceição Evaristo, uma mulher negra, com cabelos grisalhos, sorri enquanto fala e acena para o público.
A escritora Conceição Evaristo sorri e acena para o público.

Reencontrar essa geração no livro é ótimo, mas quero saudar a nova geração. O movimento negro deu cria e a questão racial no Brasil está muito longe de ser respondida”, declarou a ganhadora do Prêmio Jabuti de Literatura 2015, que contribuiu para a coletânea com o texto “Independência do Brasil: uma pátria de muitos gritos".

Outra presença marcante no palco do Museu do Amanhã foi a primeira professora transsexual do Instituo Federal do Rio de Janeiro, doutora em psicologia social do trabalho e das organizações e comentarista do programa Debate, do Canal Futura, Jaqueline Gomes de Jesus. A autora do texto “Dos julgamentos da inquisição aos das urnas: a resistência LGBTI+ negra brasileira” destacou a importância de revisitar e reinterpretar a história brasileira.

“No meu capítulo estou representando várias pessoas que foram inviabilizadas, violentadas, estupradas e assassinadas. Trago a reflexão dessa população que hoje chamamos de LGBT e vem com muitas histórias de apagamento. Lembro a história de Xica Manicongo, que só foi chamada de Xica porque uma amiga, travesti preta do Rio, Marjorie Macchi, a chamou de Xica. Até então os pesquisadores ainda a chamavam pelo nome que os portugueses deram para ela quando a traficaram do reino do Congo”, explicou Jaqueline.

Uma mulher negra fala ao microfone, com um dos punhos cerrado.
Jaqueline Gomes de Jesus destacou a importância de revisitar e reinterpretar a história brasileira.

Para finalizar o evento, o Professor Hélio Santos compartilhou com o público uma série de propostas, intituladas “Um Novo Acordo para a Equidade Racial no Brasil”, anexadas ao livro, que exprimem ideias de ações práticas de combate às desigualdades raciais em diversos campos.

A produção do livro está a cargo da Editora Jandaíra, que publica o Selo Sueli Carneiro e a Coleção Feminismos Plurais, e conta com a parceira do Instituto Çarê. A publicação pode ser encontrada pelo valor médio de R$ 90,00 (noventa reais) em lojas e livrarias físicas e digitais, assim como no site da Editora Jandaíra.